Escrevo este texto de Belgrado, onde fui convidado estrangeiro à primeira (bem sucedida) Marcha LGBT na Capital da República Sérvia. A mesma reuniu cerca de 1000 activistas e foi apoiada por diversas forças politicas progressistas, pelo Governo sérvio e organizada por associações LGBT locais. Como medida de precaução, quase metade da cidade foi totalmente fechada ao trânsito (o centro de Belgrado), 5.000 polícias destacados (forças anti-tumulto e brigadas especiais) e desenhado um aparato logístico preocupado integralmente em proteger a integridade física dos participantes na Marcha.
Todos os manifestantes foram identificados pela policia, que durante todo o dia se comportou impecavelmente, transportando no final da Marcha os activistas para esquadras nos arredores de Belgrado (que daí apanharam táxis para regressarem às suas casas). Entretanto, nas ruas circundantes confirmaram-se os piores receios: dezenas de confrontos entre as forças de segurança e grupos clerico-fascista-nazis-homófobos espalharam o pânico pela cidade; onde vários carros foram incendiados, a sede do Partido Democrático vandalizada e mais de uma centena de pessoas hospitalizadas.
Estes muitos pequenos grupos (geralmente de cinco / dez pessoas) rapidamente se acumularam num par de lugares pré-designados da cidade (o que denota uma boa capacidade organizativa) procurando mais colocar em causa a capacidade de intervenção da policia sérvia que a própria Marcha em si. Aliás, comportamento idêntico ao da passada quarta-feira aquando do jogo Itália-Sérvia, em Génova. Tal comportamento reiterado, de grupos de jovens adolescentes (muitos não terão mais de 16, 17 anos) comprova que os ataques à Marcha pouco tiveram que ver com o tema em questão (LGBT) e mais com o comportamento anti-sistémico e arruaceiro destes grupos de extrema-direita. Esperemos que a sociedade politica sérvia aproveite esta oportunidade para – de uma vez por todas – combater estes marginais, que pouco se destacam de comuns pequenos bandidos.
Admito no entanto, que em muitos momentos do fim de semana passado me esqueci que estava na capital de um país europeu, candidato à União Europeia, julgando-me antes num Estado fictício dominado por uma minoria emprenhada de ódio e sustentada apenas no uso gratuito de violência explicita contra todos os que não cumpram com a bitola machista, homófoba e rácica desenhada por um bando retrógrada de skin-heads datados. Mais estranho me sentia porque, a sei que na sociedade sérvia tem conseguido transformar-se numa sociedade europeia, em todos os sentidos da palavra, com uma cultura progressista muito interessante. Não entendo, nem admito, por isso, que os sérvios sejam confundidos por estes marginais, mais preocupados em vandalizar e roubar que em se apresentarem como alternativa politica para qualquer coisa.
Enquanto o caos se ia violentamente instalando, no pacífico centro do furacão celebrávamos a Igualdade, e partilhávamos o sentimento colectivo de que estávamos perante um dia de libertação histórica, onde – pela primeira vez em Belgrado – se combateu o ódio e a homofobia de frente, pacificamente. E se os bandos de neo-nazis iam deixando um rasto de destruição vândala, nós deixámos uma forte marca de esperança e modernidade para toda a região balcânica, não só para a Sérvia.
Tenho naturalmente de destacar o excelente trabalho realizado pelas diversas associações LGBT sérvias. Conheci muitos dos seus lideres, que tem de andar disfarçados na rua por sofrerem constantes ameaças de morte, e reconheço que o trabalho que desenvolvem é não só extremamente difícil como de uma coragem incrível. É que eu passei um fim de semana em Belgrado. Eles e elas vivem na cidade o ano inteiro.
Juntamente com as associações e movimentos LGBT é de destacar a presença, este ano, de diversos partidos políticos que deram cobertura ao evento. Deles, o Partido Democrático tem de ser destacado, não só por liderar o executivo, mas também por ter dado a cara desde o primeiro momento. Não estranha, por isso, o ataque à sua sede, uma vez que o que menos desejam os grupos nazis sérvios é o desenvolvimento sustentável do seu pais e a construção de uma sociedade progressista, inclusiva e plural.
Imaginam, portanto, o quão interessante e intenso foi este fim de semana. Ter tido o privilégio de ter estado presente em tão simbólica manifestação foi, talvez, das actividades politicas que mais me orgulho. Sei que a Marcha do próximo ano não será fácil, mas poderão contar comigo com certeza. É nestas alturas que sabe bem lutar pelos direitos de quem não os tem.
. Um acto de primeiríssima ...
. Madiba e as vacas sagrada...
. A importância de um candi...